É possível a intercepção telefônica no âmbito civil em situação de
extrema excepcionalidade, quando não houver outra medida que
resguarde direitos ameaçados e o caso envolver indícios de conduta
considerada criminosa. A decisão é da Terceira Turma do Superior
Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar habeas corpus preventivo em que o
responsável pela execução da quebra de sigilo em uma empresa telefônica
se recusou a cumprir determinação judicial para apurar incidente de
natureza civil.
O Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul
(TJMS) julgou correta a decisão do juízo de direito de uma vara de
família, que expediu ofício para investigar o paradeiro de criança
levada por um familiar contra determinação judicial. O gerente se negou a
cumprir a ordem porque a Constituição, regulamentada neste ponto pela
Lei 9.296/96, permite apenas a interceptação para investigação criminal
ou instrução processual penal.
O TJMS considerou que é possível a
interceptação na esfera civil quando nenhuma outra diligência puder ser
adotada, como no caso julgado, em que foram expedidas, sem êxito,
diversas cartas precatórias para busca e apreensão da criança. O órgão
assinalou que o caso põe em confronto, de um lado, o direito à
intimidade de quem terá o sigilo quebrado e, de outro, vários direitos
fundamentais do menor, como educação, alimentação, lazer, dignidade e
convivência familiar.
Para o tribunal local, as consequências do
cumprimento da decisão judicial em questão são infinitamente menos
graves do que as que ocorreriam caso o estado permanecesse inerte.
Segundo o relator no STJ, ministro Sidnei Beneti, a situação inspira
cuidado e não se trata pura e simplesmente de discussão de aplicação do
preceito constitucional que garante o sigilo.
Embora a ordem
tenha partido de juízo civil, a situação envolve também a necessidade de
apurar a suposta prática do delito previsto pelo artigo 237 do Estatuto
da Criança e do Adolescente (ECA): “Subtrair criança ou adolescente ao
poder de quem o tem sob sua guarda em virtude de lei ou ordem judicial,
com o fim de colocação em lar substituto.”
O ministro destacou
que o responsável pela quebra do sigilo não demonstrou haver limitação
na sua liberdade de ir e vir e não há informação no habeas corpus sobre o
início de processo contra ele, nem sobre ordem de prisão cautelar. “Não
toca ao paciente, embora inspirado por razões nobres, discutir a ordem
judicial alegando direito fundamental que não é seu, mas da parte”,
ressaltou o ministro.
“Possibilitar que o destinatário da ordem
judicial exponha razões para não cumpri-la é inviabilizar a própria
atividade jurisdicional, com prejuízo para o Estado Democrático de
Direito”, afirmou o ministro. Tendo em vista não haver razões para o
receio de prisão iminente, a Terceira Turma não conheceu do pedido de
habeas corpus impetrado pela defesa.
Fonte: STJ
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